quinta-feira, 4 de março de 2010

Universidades não contribuem na formação de atletas

Apesar do potencial, universidades brasileiras não contribuem para a formação de atletas no Brasil. A falta de engajamento, ainda que histórica, pode se tornar um problema ainda maior e mais evidente com a aproximação dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, em que o Brasil será o anfitrião. Além de sediar a competição internacional e, portanto, ter de investir na construção de infra-estrutura, o País terá de discutir também a formação dos atletas que participarão dos Jogos. As universidades, que poderiam contribuir nesse aspecto, permanecem longe de participar consideravelmente dessa tarefa.
Segundo dados do Atlas do Esporte no Brasil, apenas 39% da população brasileira pratica esportes olímpicos. Em 2005, segundo o balanço anterior, foram computados 395 mil atletas federados, 8 milhões de esportistas regulares e outros 65 milhões de praticantes ocasionais. O número é ainda menor se considerada a participação do País nas competições internacionais. Nos Jogos de Pequim, em 2008, por exemplo, foram enviados 277 atletas brasileiros, contra 579 representantes chineses e 421 russos.
Os baixos índices também estão ancorados - não só, mas também - na ausência de ações dentro dos campi universitários. É a crítica de Marco Aurelio Klein, diretor do Departamento de Excelência Esportiva da Secretaria Nacional de Alto Rendimento do Ministério do Esporte. "Embora não sejam responsáveis pela base do processo, a instituição de Ensino Superior é um dos agentes da formação de atletas no País", diz ele, que destaca o apoio da tradição brasileira nos clubes sociais. "O Brasil mantém mais de 13 mil centros com infra-estruturas para a formação de atletas. A maioria deles concentrados no sudeste e com grande representatividade do SESI (Serviço Social da Indústria)". Klein, no entanto, lamenta a falta da participação da universidade.
A atuação do Brasil seria contrária a do líder mundial de atletas olímpicos em competições internacionais. "O desenvolvimento esportivo nos Estados Unidos está calcado nas universidades. As grandes competições são universitárias, as empresas investem nas instituições de ensino e os grandes talentos são encontrados no ambiente acadêmico", diz Jorge Steinhilber, presidente da CONFEF (Conselho Federal de Educação Física. Nos Jogos Olímpicos de 2008, por exemplo, a comissão esportiva estadunidense foi representada por 646 atletas e conquistou a segunda colocação no quadro de medalhas.
O poder estratégico da universidade no processo de formação de atletas no Brasil, na opinião de Daniel Marangon, coordenador do complexo esportivo da PUC- Minas (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais), é desperdiçado em ações de marketing. "Diferente de instituições européias e estadunidenses que investem na formação de talentos, as brasileiras optam por estampar suas marcas na camiseta de atletas já capacitados. Patrocinam não porque têm um programa de esporte, mas sim porque querem visibilidade", dispara ele.

Marco legal
Além do problema cultural, a fraca contribuição das instituições de Ensino Superior para a revelação de atletas de alto rendimento é explicada pela própria legislação esportiva. "O marco legal vincula o esporte universitário aos DCE's (Diretórios Centrais dos Estudantes). Relação que dificulta o protagonismo da universidade no campo esportivo, a partir da promoção de ações mais estratégicas", cita Marangon.
A dificuldade também é incrementada pela restrição orçamentária das universidades. É o que afirma Emerson Silami Garcia, diretor da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). "Com a limitação de recursos, os investimentos no esporte, geralmente, ficam em segundo plano", ressalta ele, que enfatiza a necessidade da criação de mais parcerias entre as instituições de ensino e o Ministério do Esporte, os governos municipais e federais.
De acordo com Klein, ao contrário do que se pensa, não faltam recursos no setor esportivo. "Há verbas das três esferas do governo, de patrocínios, de empresas que aderiram à lei de incentivo, do Comitê Olímpico Brasileiro e Internacional e de clubes", menciona ele, que destaca a necessidade da criação de um direcionamento estratégico para os recursos disponíveis. "Direção que deve estar baseada nas carências do País, nas práticas internacionais adaptadas a realidade brasileira, a personalização das ações e metodologias direcionadas a curto, médio e longo prazo, ou seja, focando as Olimpíadas de 2012, 2016 e até a de 2020", sugere o diretor do Ministério do Esporte. Segundo ele, essas são as principais características de um projeto de lei que será encaminhado ao Congresso Nacional para aprovação a partir de março.
A participação das universidades, portanto, deve transcender a formação de atletas de alto nível. "Também devem contribuir com a democratização do acesso das mais variadas modalidades esportivas", diz Carlos Bonone, coordenador do Programa UCS Olimpíadas, da Universidade Caxias do Sul, que faz uma crítica aos modelos políticos adotados pelas poucas instituições brasileiras que contribuem para a capacitação de esportistas. "As ações se limitam a identificação de possíveis talentos, restringem o treinamento apenas àqueles que demonstrarem aptidão", declara Marangon.
Embora os atletas que competirão nas Olimpíadas do Rio não sejam reaproveitados da base do processo de formação, Garcia enfatiza a necessidade dos investimentos na prática esportiva desde a infância . "Em 2016, serão reaproveitados parte dos atuais atletas e ainda dos jovens que competem os campeonatos juvenis, desde que haja incentivos para a capacitação deles. Não se pode esperar, no entanto, os Jogos Olímpicos acabarem para se construir uma metodologia brasileira mais sólida", defende o diretor da UFMG.
Para o representante do Ministério do Esporte, sem a criação de uma base democrática da prática esportiva, a descoberta de talentos acaba sendo prejudicada com a limitação das opções. "Quanto maior a base, mais chance tenho de ter atletas qualificados, competidores olímpicos e, conseqüentemente, medalhas", resume Klein. "É o caso da natação nos Estados Unidos, bem como do futebol no Brasil", acrescenta ele. Klein destaca a importância de expandir a prática esportiva, além dos campos de futebol. "Não é preciso de nenhum estudo para apontar a preferência brasileira pelo futebol, basta conferir os cadernos de esporte dos principais jornais do País para ver qual é o assunto mais tratado", acrescenta ele.
Com a carência de políticas públicas, Aragon acredita que a expansão da prática das demais modalidades esportivas fica na dependência das confederações. "Sobressai, portanto, aquelas mais organizadas como a do Voleibol, que investe na democratização do esporte e na capacitação de atletas das mais variadas categorias", diz o coordenador da PUC-Minas. Também ganham destaques temporários no cenário brasileiro as modalidades que se sobressaem em competições internacionais. "Tais como o boxe, o atletismo, a ginástica olímpica e o tênis. Mas sem uma política de desenvolvimento constante, os destaques são passageiros", alerta Garcia.
O diretor do Ministério do Esporte é otimista e enfatiza o aumento da procura de jovens pelo esporte com o maior engajamento do País em competições internacionais. "A exposição propiciada pelos Jogos Pan-Americanos no Rio de Janeiro, em 2007, contribuiu inclusive com o aumento de 120% nas inscrições do Programa Bolsa Atleta, com a representatividade em 86 modalidades esportivas", lembra Klein. (Confira mais sobre o programa no quadro ao lado)
Os benefícios do investimento da formação de atletas, para Bonone, também atingem as instituições de ensino. "Além de contribuir com o desenvolvimento do setor no País, os programas de formação de atletas colaboram ainda com a capacitação de nossos estudantes, que geralmente trabalham como estagiários nos treinos", cita o coordenador da UCS.

Além da formação de atletas
O papel das universidades no desenvolvimento do setor esportivo no País não se restringe, no entanto, à formação de atletas. De acordo com Edson Almeida Ramos, diretor do Instituto de Educação Física da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), as instituições de Ensino Superior também são responsáveis pela construção da base científica no setor esportivo. "Estudos que darão subsídios para o desenvolvimento do esporte brasileiro, bem como para colaborar para a criação de ações estratégicas em direção a formação dos atletas", aponta Ramos, que garante o engajamento das instituições, principalmente as públicas, nessa direção.
A formação, para o diretor da UFMG, também deve abranger os técnicos e os juízes brasileiros. "Atualmente, não há técnicos brasileiros capacitados para treinar os atletas do País. É preciso buscar profissionais internacionais para suprir essa carência", diz Garcia. O diretor da UERJ acrescenta ainda a necessidade da criação de cursos de pós-graduação na área de gestão esportiva.
Mesmo diante do atual cenário nacional, há instituições que conseguem romper com a tradição cultural e contribuir com a formação de atletas. Enquanto algumas investem nos esportistas de alto rendimento, outras ampliam sua atuação para as categorias de base. Cada uma delas, no entanto, trabalha com as modalidades que se destacam em suas regiões. Há um grupo de instituições, inclusive, que se reúnem para juntar esforços e ampliar os resultados. Confira no quadro abaixo algumas dessas ações.

Fonte:
www.universia.com.br

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